Desmontar Juridicamente Odemira

Enquadramento factual
A declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pelas Nações Unidas em 1948, após o desfecho de um condenável conflito mundial, atos bárbaros que marcaram a consciência da humanidade, reconhece o respeito pelos direitos humanos. Direitos esses, desprezados outrora, agora reconhecidos universalmente. No entanto, mesmo após tantas conquistas e progressos na nossa atualidade continua a haver um desrespeito enorme por estes direitos.
Da notícia...
1º PARTE
Inicio de Março 2020
Cláudia Pereira - Secretária de Estado para a Integração e as Migrações[1]
Em declarações prestadas à agência Lusa aponta para Odemira como um “concelho-piloto” no que respeita à "integração de migrantes” pelas “boas práticas” implementadas no território.[2]
2ºPARTE
19 Abril de 2021
Regressão na fase de desconfinamento no concelho de Odemira, tendo sido definido a criação de uma cerca sanitária, onde ficaria interdita a circulação por via rodoviária de, e para, as freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve tal como a permanência na via pública.[3] Situação esta, que se deveu a uma elevada incidência de casos de Covid-19 de migrantes que trabalham na agricultura da região, sendo que, estimava-se que 80% dos infetados em Odemira eram migrantes[4], tendo sido no fundo, estes que estiveram na base da decisão tomada pelo governo.
Tendo isto resultado numa indignação generalizada de toda uma nação, devido a uma perceção das miseráveis condições e gritantes violações dos direitos humanos a que se encontram sujeitos os migrantes em Odemira.
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A grande maioria sujeitos a trabalhos agrícola árduos, em que trabalham cerca de 12 horas por dia, e recebem menos do ordenado mínimo.
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Vivendo em casas com uma lotação 10x superior à esperada, havendo exemplos de T3 com cerca de 33 pessoas. Pelo preço de 120€ por pessoa, o que dá um total de 3960 € mensais por uma T3 em Odemira.[5]
Ora, refere-nos a Constituição da Republica Portuguesa que todos têm direito a uma habitação condigna em Portugal e deverá cumprir a lei e as garantias consagradas no direito internacional, a Constituição da República Portuguesa, consagra no artigo 65.º, “Todos têm direito à habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal.” Sendo necessário o respeito pela dignidade e os direitos da pessoa humana. Porém, atendendo aos factos supra expostos, não nos parece que seja o que se concretiza.
3º PARTE
29 de Abril de 2021
Não tenha havido qualquer tipo de acordo entre os proprietários do empreendimento Zmar, em Odemira, e o Governo, este decide avançar com uma requisição civil, com o fundamento em “motivos de urgência e de interesse público e nacional”. Sendo que, no despacho, publicado em Diário da República, define que a responsabilidade de gerir o empreendimento turístico passaria a ser do município de Odemira, juntamente com o a autoridade de saúde e da Segurança Social. Pelo que, a requisição civil seria válida porquanto a declaração da situação de calamidade fosse aplicável ao concelho. Todavia, os proprietários do Zmar opuseram-se a esta, e com sucesso, tendo o Supremo Tribunal Administrativo decidido a seu favor.
Mas afinal, em que consiste a requisição civil?
Esta figura jurídica está regulamentada pelo Decreto-Lei Nº 637/74, de 20 de Novembro, onde estão definidos os seus princípios gerais. A requisição civil visa assegurar o funcionamento de determinados setores cujas atividades, se ficassem temporariamente suspensas, perturbariam a vida económica, social e interesse público.
A possibilidade de recorrer à requisição civil encontra-se também prevista no Código de Trabalho, pela Lei Nº 7/2009, sendo que no seu artigo 537º lista as empresas que se destinam à satisfação de necessidades impreteríveis, a saber:
- Correios e telecomunicações;
- Serviços médicos, hospitalares e medicamentosos;
- Salubridade pública, incluindo a realização de funerais;
- Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis;
- Abastecimento de águas;
- Bombeiros;
- Serviços de atendimento ao público que assegurem a satisfação de necessidades essenciais cuja prestação incumba ao Estado;
- Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho-de-ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respetivas cargas e descargas;
- Transporte e segurança de valores monetários.
Porquê esta possibilidade no Código do Trabalho? Ora, como sabemos, todos os trabalhadores têm o seu direito à greve constitucionalmente consagrado. Contudo, este direito não se pode considerar absoluto. Numa situação de conflito entre dois direitos constitucionalmente consagrados, o direito à greve e a necessidade de cumprimento dos serviços mínimos impreteríveis, prevalece este último.
Deste modo, podemos ver a seriedade desta figura e o porquê de só ser legítima a sua utilização quando vise salvaguardar outros interesses constitucionalmente protegidos.
Sabias que…?
Em Portugal, a requisição civil já foi aplicada 32 vezes? Decerto te deves recordar da última vez, em 2019, aquando da greve dos motoristas de matérias perigosas.
4º PARTE
3 de Maio de 2021
Estas situações resultaram no facto da Polícia Judiciária ter iniciado a investigar aparentes denúncias de imigração ilegal, tráfico e escravatura em Odemira[6]
5º PARTE
12 Maio 2021
No entanto, a secretário de Estado refere na entrevista à RTP que: “nós já conhecíamos estas imagens” e por isso mesmo começamos a trabalhar com as autarquias e com as empresas.[7]
[3] https://www.jornalsudoeste.com/?diaria=6385