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Dra. Maria do Carmo Custódio - Dos números ao Direito

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Licenciada em Direito pelo ISMAT em 2014, a Dra. Maria do Carmo Custódio é atualmente Chefe do Serviço de Finanças de Portimão, assim como Docente no ISMAT, onde leciona a disciplina de Direito Fiscal.

Entrevista Por Gonçalo Camacho e Mara Rodrigues 

Conte-nos um pouco do seu percurso.

                Eu comecei o curso de Direito por uma circunstância de trabalho, em 2008, todavia tive de parar por questões profissionais, uma vez que já estava a chefiar um serviço de Finanças Loulé 2, Quarteira, e como ainda estava no meu início de carreira, havia uma maior ansiedade, pelo que, congelei a matrícula.

                Relativamente ao percurso profissional, comecei a trabalhar no privado, entretanto surgiu a oportunidade de concorrer a um concurso público da AT, e foi precisamente isso que eu fiz, passei todo esse processo, os psicotécnicos, as entrevistas, todas essas formalidades necessárias e pronto, entrei.

                De facto, achei desafiante, aliás continua a ser desafiante, existem sempre muitas vertentes, muitas exigências, e há sempre com novas situações que nos deparamos no nosso dia-a-dia.

                Curiosidade: Fui a primeira chefe mulher do distrito de Faro, ainda era uma menina perto de todos os meus colegas, mas foi assim mesmo, fui progredindo aproveitando todas as oportunidades que me eram conferidas.

 

Como surgiu a vontade de tirar o curso de Direito, sempre foi um objectivo ou surgiu por motivos profissionais?

 

Não, não foi um objetivo, eu enquanto aluna do secundário sempre gostei mais de números, da parte das ciências, matemática, sendo que, até me achava mais apta para essas áreas. Porém, quando comecei a assumir responsabilidades dentro do serviço de Finanças, senti necessidade de me fundamentar, e de ter mais segurança nas decisões que tomava. Portanto, no fundo, a escolha do curso de Direito, foi uma necessidade profissional uma vez que até já estava em cargo de chefia.

 

               

 

Poderia explicar como funciona o acesso à sua profissão?

                Através de concursos de acesso, com psicotécnicos, entrevistas, testes de cultura geral, e depois de tudo isto, sai uma lista com a classificação de todos os candidatos.

                   Porém, nos últimos anos os únicos concursos que têm sido abertos, são dentro da própria Administração Pública, que estão apenas disponíveis para quem já faz parte da Administração Pública.

                Normalmente estes cursos são muito concorridos, julgo que o último concurso houve cerca de 100 mil participantes, portanto, como podem perceber, são cursos sempre muitos disputados.

              Outra questão é a progressão na carreira dentro da AP, estamos sempre condicionados às decisões políticas e aos dinheiros públicos, portanto há sempre estas contingências. Apenas agora, parece que está a recomeçar as pessoas voltarem a poder progredir na carreira, porque de facto faz falta, eu própria sinto essa falta. Embora possa parecer, e há colegas que possam dizer: “estás no topo da carreira”. Mas, e peço desculpa pela expressão, no topo da minha carreira uma treta! Não se chega ao topo da nossa carreira aos 30 anos, na altura parei, porque teve de ser.

               

 

Quando as pessoas se dirigem aos serviços de Finanças, normalmente, não é pelas melhores razões. Muitas delas encontra-se em situações de descontentamento, e algumas, de desespero até. Tendo a professora Maria do Carmo largos anos de experiência nesta área, qual diria que é a melhor maneira de lidar com estas situações

                Acho que a melhor maneira de se lidar com estes casos é, enquanto funcionário, colocarmo-nos um bocado do lado do contribuinte, sendo certo que, do outro lado muitas das vezes, está um indivíduo que está em dificuldades, apuros, graves problemas pessoais, económicos.

                Já eu, enquanto chefia, tenho uma técnica. Quando as coisas estão mais azedas, chamo o contribuinte para o meu gabinete. Primeiro porque está numa zona mais reservada, em que, pelo menos, naquele serviço está no topo e lhe está a ser dada atenção. Segundo, porque colocamos o contribuinte fora do seu território. Entra no gabinete, senta-se e falamos com o mesmo normalmente.

 

                    O Direito fiscal, para as entidades públicas, na grande maioria das vezes, apresenta um contexto inflexível. Muitas das vezes havendo até circulares a definir qual o rumo que as situações em concreto devem seguir. Mas, ao mesmo tempo, muito dinâmico pois todos os anos o orçamento de estado sofre alterações, alterando assim o Direito Fiscal.

Professora Maria do Carmo, como é que se consegue conjugar estas duas coisas, em que se por um lado há uma grande inflexibilidade no direito fiscal, por outro há uma constante mutação do mesmo?

                São de facto dois desafios. Por um lado estamos sempre limitados ao que a lei nos permite, onde não temos grande margem de manobra, quer devido à lei, ou a essas circulares que referi, acabando isto, por ser uma vertente que nos limita, porque nem sempre conseguimos arranjar uma solução para o contribuinte, nem sempre o conseguimos ajudar naquela situação, uma vez que trabalhamos dentro de parâmetros rígidos.

                Por outro lado, sim, de facto outro desafio são as múltiplas alterações a que estamos sujeitos, sendo isso extremamente exigente, porque aquilo que aprendemos há uns meses atrás, tem de se “reciclar”.

                Sendo, por isso, muito difícil até para nós que trabalhamos na área nos mantermos atualizados, estamos constantemente a recorrer à informação que está no portal das finanças. Todavia nem sempre o próprio website é célere na inclusão destas alterações na legislação. Portanto, não é uma profissão monótona!!!

 

A professora Maria do Carmo já estava a exercer o seu cargo de chefia nas finanças, ou seja, já tinha essa estabilidade no seu trabalho. Portanto, o que a levou a querer dar aulas a um curso de Direito?

                Porque não sou uma pessoa acomodada, gosto de desafios e fazer múltiplas coisas, foi uma proposta que me foi feita, que agradeço plenamente.

              Por outro lado, eu gosto do contacto com as pessoas, gosto do ambiente da faculdade, provavelmente até mais com os alunos, do que propriamente entre os professores.

                Mas sobretudo pelos alunos, porque realmente tenho sentido na maioria dos casos um apreço por parte dos alunos, e nesse sentido isso é sempre um grande apelo para continuar no ano seguinte. Sendo certo que, quando já não sentir isso, eu saio.

 

É sabido que o ramo do Direito Fiscal é uma das áreas do Direito que apresenta uma maior complexidade técnica. Não obstante, gostaríamos de perguntar a si, que já lida com este ramo há vários anos, qual é a maior dificuldade que sente no seu dia a dia.

                Maior dificuldade deriva precisamente da rigidez das decisões que tenho de tomar, em que por vezes é necessário tomar decisões que sabemos que serão muito complicadas para o contribuinte. Essas acabam sempre por ser as situações mais complexas, em termos humanos, porque é difícil ser apenas chefe de finanças e não ser pessoa, e sendo pessoa eu tento-me pôr na posição de quem está do outro lado.

                Porém é sempre difícil a parte executiva, porque sabemos que vamos implicar com a vida das pessoas. Não obstante de, na minha opinião, ser até a mais gratificante, uma vez que é a área em que se lida mais com o Direito.

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