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E se a Semana Tivesse 4 Dias de Trabalho?

Mesa de trabalho

Na Assembleia da República, em maio de 2022, foi apresentada a proposta da semana de quatro dias de trabalho, sendo que os deputados consideraram analisar a proposta com o objetivo de criar um projeto-piloto.

Posto isto, no mês de outubro, com a divulgação do projeto por parte do Governo será possível compreender como irá funcionar a aplicação deste novo sistema de trabalho, esperando-se que este experimento dê início em 2023. Este projeto tem como principal coordenador Pedro Gomes, professor de Economia na Universidade de Londres e autor do livro “Sexta-feira é o novo sábado”. O mesmo propõe uma redução significativa de horas de trabalho sem cortes no salário, um “teste” para as empresas que queiram participar, não consistindo ainda na criação de uma política. Assim sendo, o objetivo fundamental consiste em medir o impacto nos trabalhadores e nas empresas no que toca à produtividade e os custos intermédios das empresas, tendo em conta o produto final.

Desta forma, é necessário evidenciar quais são as vantagens e desvantagens do mesmo. Em primeiro lugar, quanto aos problemas de recrutamento que existem nas empresas, a solução para tal dá-se com o aumento das retribuições, contudo, este sistema inovador dos quatro dias, irá conferir uma melhoria das condições de trabalho, tornando assim a contratação mais apelativa. Outro problema que os quatro dias de trabalho resolve é a elevada taxa de absentismo que, em Portugal, maioritariamente, na indústria têxtil atinge os 20%, portanto se as empresas adotarem a semana de quatro dias de trabalho, os trabalhadores irão faltar com menos frequência, pois, quando necessitarem de tratar de assuntos pessoais, terão um dia a mais para o fazer. Para além disso, é vantajoso porque tendo a semana quatro dias de trabalho vai-se verificar uma redução de custos, dado que, há mais um dia em que não há nenhum trabalhador na empresa e, por conseguinte, não existem máquinas a funcionar, logo não se gasta nem energia nem água. A manutenção das mesmas será menor e os custos serão menores, o que irá auxiliar na gestão de custos. Deste modo, o impacte ambiental diminui também, na medida em que a pegada ecológica de cada colaborador é menor, por exemplo, através da redução das deslocações diárias para o trabalho.  Por último, com a redução de horas de trabalho, exige-se do trabalhador um maior foco e atenção na concretização das suas tarefas, o que leva ao aumento da produtividade, ao contrário do que se idealiza de o trabalhador ao ter mais horas de trabalho será mais produtivo, o que já se verificou ser uma ideia errada, uma vez que, com menos tempo para distrações, consequentemente, há uma redução significativa de erros no processo de produção, tal como, acidentes de trabalho. Tudo isto tem um grande impacto no bem-estar e felicidade do trabalhador, reduzindo-se assim o stress e o “burnout”.

Todavia, este sistema tem as suas falhas, que impossibilita de certa forma o seu alcance a determinadas empresas, dado que, se colocam vários entraves. A título de exemplo, as empresas, como certas indústrias que trabalham 24 sob 24 horas, todos os dias, a sua aplicação é inviável. Para além disso, como já foi mencionado à priori, com a redução de horas laborais os trabalhadores necessitam de ter um maior foco e atenção e uma melhor gestão do tempo, o que acaba por se tornar numa adaptação difícil, exigindo-se o desenvolvimento de novas skills, que nem sempre resultam, tendo como consequência valores de produtividade abaixo da expectativa. Por fim, outra desvantagem relaciona-se com o cliente, pois, havendo menos um dia para o atendimento, existe a possibilidade de pôr em causa a relação que existe entre empresa e cliente, resultando na diminuição da satisfação do mesmo.

O projeto-piloto coordenado pelo Professor Pedro Gomes, que vai ser testado em Portugal, vai ter em conta três modelos. O primeiro modelo é o teste que foi feito no Reino Unido, que não implica nenhuma intervenção do Estado. É realizado por um género de consultora ativista, como por exemplo, a “4 Day Week Global”. O projeto é conduzido por Andrew Bames, um empresário da Nova Zelândia, que implementou na sua empresa a semana de quatro dias, apoiando empresas que tenham a mesma iniciativa e queiram entrar neste modelo de trabalho. Uma vez que o Estado não intervém, não há financiamento para as empresas, elas pagam à consultora uma pequena quantia para puderem aceder a workshops e ter apoio nesta mudança.

Relativamente ao segundo modelo, este pertence ao projeto-piloto realizado na Islândia e, segundo vários investigadores, o projeto foi um grande sucesso, pois foi possível reduzir a carga horária e manter as retribuições dos trabalhadores. Inicialmente, este teste aplicou-se apenas ao setor público, nomeadamente, em certos escritórios do governo, tanto central como local, em hospitais públicos, serviços socias, entre outros. Depois de se verificar que o teste resultou, várias empresas começaram a adotar este sistema.

Por fim, o último modelo surge em Espanha, tendo sido direcionado maioritariamente para as empresas industriais. Neste modelo, a ideia principal é inovar a empresa com novas máquinas, novas formas de produção, por exemplo através da utilização de inteligência artificial para aliviar a carga de trabalho dos trabalhadores. Para que tal fosse exequível foi disponibilizado um subsídio até 250 mil euros. Este projeto-piloto tem como principais fundamentos o fornecimento de ajudas públicas, em regime de concorrência competitiva, para as empresas de forma voluntária inserirem a redução das horas de trabalho e, incentivar a inovação de processos produtivos, novas contratações e recursos formativos.

Em suma, Portugal e as suas empresas vão ter um grande desafio pela frente, pelo facto deste projeto revelar um elevado grau de complexidade e um grande risco, uma vez que, a concretização deste regime depende de inúmeros fatores, tais como, a vontade em inovar por parte do próprio trabalhador, uma boa gestão de tempo e recursos, o mercado em que se inserem, etc., não sendo de igual forma para todos, pois, cada empresa apresenta as suas dificuldades, podendo as expectativas da produção e do bem-estar do trabalhador ficar abaixo dos resultados que se esperava atingir, questionando-se assim a vontade de as empresas quererem participar voluntariamente.

 

Tendo como seguimento do tema exposto sobre a respetiva semana de quatro dias de trabalho, foi nos dada a oportunidade de colocar algumas questões que surgiram durante o desenvolvimento desta matéria, tendo a especial participação do Professor Doutor José António Coelho, docente universitário na área de Direito do Trabalho e investigador do Centro de Estudos Avançados em Direito Francisco Suárez e o Professor Doutor Ricardo Oliveira, docente universitário na área de Economia Política

 

Tendo em consideração o grau de complexidade do projeto-piloto relativamente à adoção da semana de quatro dias de trabalho, na sua opinião será esta uma possibilidade em Portugal?

Professor Doutor José António Coelho: A questão de uma eventual adoção da semana de 4 dias de trabalho, fará parte de uma discussão global, e tal dependerá por exemplo da natureza do negócio envolvido, se não imagine-se como podem vir a funcionar as empresas tendo em consideração o regime por turnos, que e ainda que possa ter uma atitude unilateral será sempre com acordo com os trabalhadores, e ainda outra questão que se pode colocar em causa na eficácia da proposta é a forma como os trabalhadores que já têm uma grande carga de trabalho se poderão adaptar à ideia de que devem fazer o mesmo, mas em menos dias!?

Investigadores que se têm debruçado nesta matéria e que são a favor de uma semana de trabalho reduzida, já alertaram que é muito difícil para um trabalhador sobrecarregado adaptar-se à semana de quatro dias, porém também afirmam que e apesar de potenciais desvantagens, valerá a pena a experiência.

O que podemos verificar até hoje é que embora a produtividade e o absentismo tenham melhorado, os custos dispararam porque tiveram de contratar mais trabalhadores para cobrir os turnos.

Evidentemente que um horário concentrado pode libertar um dia por semana, mas também representa um desafio para os progenitores que trabalham, especialmente quando crianças pequenas estão envolvidas; tentar combinar horários de atividade, necessidades de creche e outras consultas necessárias pode e nem todas as empresas trabalham sob uma estrutura de programação compactada, e se alguém precisa trabalhar em estreita colaboração com outra empresa e vai para casa às 17:00h, o que esse trabalhador fará nas últimas duas horas? Há uma boa probabilidade de um empregador pagar a um trabalhador para não fazer absolutamente nada por causa da logística de suas relações de trabalho.

Os 4 dias de trabalho mostram que, quando estruturado corretamente, pode ser extremamente benéfico, mas também pode apresentar certos desafios que podem estar sempre presentes, ou seja, se os conflitos de fadiga e agendamento podem ser resolvidos

de alguma forma, então implementar a programação compactada pode fazer sentido. Ou seja, havendo já empresas em Portugal que estão a cumprir este horário semanal num sistema híbrido de presencial e teletrabalho, a evolução de um “projeto-piloto” merecerá estas experiências e futuras discussões a nível de concertação laboral.

 

Será que a lei portuguesa tem um mínimo de flexibilidade para responder aos desafios colocados, sendo capaz de criar uma política? Ou o Código de Trabalho prevê algum entrave?

Professor Doutor José António Coelho: Em Portugal a lei portuguesa – o Código do Trabalho em particular - permite a opção de quatro dias de trabalho por semana, mas apenas com o aumento da carga horária diária, isto é, esta flexibilidade no trabalho é possível através da adoção do horário concentrado, como está plasmado no Art. 209 do CT. desde que haja acordo entre empregador e trabalhador ou por Instrumento de Regulamentação Coletiva (IRCT), para concentrar o período normal de trabalho semanal no máximo de quatro dias de trabalho; no caso de IRCT estabeleça um horário de trabalho que contenha, no máximo, três dias de trabalho consecutivos, sendo que estes devem ser seguidos, no mínimo, de dois dias de descanso, e a duração do período normal de trabalho semanal deve ser respeitada, em média, num período de referência de 45 dias.

Neste regime de horário de trabalho não pode ser simultaneamente aplicável o regime de

adaptabilidade conforme Arts. 205º e 206º do CT.

E já agora, para as retribuições se poderem manter iguais correspondentes aos cinco dias úteis de trabalho, é necessário que os níveis de produtividade dos trabalhadores aumentem significativamente, pois desta forma as empresas podem manter ou melhorar os seus resultados, assegurando o mesmo nível de retribuição aos seus trabalhadores (ou até melhorá-lo), contudo há sempre que ter em consideração que o conceito de “quanto mais se trabalha mais se produz”, podemos apreciar e não concluir, que menos horas de trabalho podem aumentar a motivação e consequentemente reduzir o absentismo e o risco

de doenças profissionais.

 

É possível reduzir o horário laboral sem reduzir a remuneração e a produtividade?

Professor Doutor Ricardo Oliveira: As questão-chave e os recurso-chave, chamam-se tempo e eficiência.

Ex: Um aluno estuda durante 5 dias. Para o ano, só pode estudar 4 dias!

Ele não quer reduzir as notas nem a eficiência, isto é, as notas e a eficiência mantêm-se constantes.

Orientação input da (Oi) Eficiência: Com menos, fazer o mesmo. Com menos tempo produzir o mesmo.

Só há um caminho: O da eficiência (orientação – input). Trabalhar mais rápido e melhor!

Implica gerarem-se incentivos e otimizar-se o processo, para os alcançar.

A questão do incentivo: Tem mais um dia de lazer! Boa notícia! Aceitará, de bom grado.

Há outra questão como otimizar o processo: Melhor treino, formação, cultura organizacional e “mente”. O próprio lazer será um motor adicional de produtividade. Vai descansar mais, terá mais energia para o novo eixo do tempo.

A prazo poderá haver quebras de produtividade motivadas pelo hábito, rotina e amortecimento da consciência do

incentivo.

 

Considerando o dia extra de descanso promovido pelo respetivo projeto-piloto, pode-se supor que seja algo benéfico para a economia portuguesa a começar pelo aumento do consumo de produtos e serviços em setores como o da cultura, lazer e turismo?

Professor Doutor Ricardo Oliveira: Tenderá a beneficiar a Economia do Lazer, e sobretudo o hipercluster da Economia do Mar em rápido crescimento.

Ativará também o Efeito K, o multiplicador deste cluster transversalmente em toda a Economia, com todos os seus efeitos nos Agregados Macroeconómicos e no Ambiente micro das organizações.

O exemplo de fenómenos deste tipo na economia alemã tem-se revelado inspirador. Não é trabalhar muito, mas menos e muito bem! Não esquecer que parte deste novo trabalho será “at home”.

De notar que “alguma preguiça produtiva”, motivada pela menor produtividade de alguns ocupantes deste novo veículo, também induzirá a criação de algum emprego marginal. Um dia chegar-se à ao equilíbrio, a este novo equilíbrio Trabalho-Lazer.

Bem-Vindos ao tempo da eficiência no eixo do tempo! Bem-Vindos à produtividade e ao seu output: Lazer com bem-estar.

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