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Título 1

Advogada - Doutora Cláudia Boloto

Título 1

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Em primeiro lugar, gostaríamos de lhe perguntar qual foi o motivo que a levou a escolher advocacia, e se sempre foi a área que tinha em mente quando ingressou no curso?

Decidi frequentar o curso de direito porque é uma área de que sempre gostei. Fiz a licenciatura de 5 anos e no final, tendo em conta as profissões disponíveis nesta área, considerei que a advocacia era aquela em que me sentiria mais realizada, por vários motivos.

Em primeiro lugar é uma profissão onde não temos dois dias iguais. É uma atividade muito diversificada, sem o cumprimento de horários rígidos e permanência no escritório, das nove da manhã às seis da tarde.

Como não me via presa num gabinete, achei que a advocacia seria o mais adequado às minhas expectativas e optei por esta profissão. E ainda bem, porque sou muito feliz.

Poderia explicar como funciona o acesso à sua profissão?

O acesso à advocacia faz-se em dois momentos distintos: numa primeira fase é necessário obter a licenciatura em Direito e, depois, ingressar no estágio da Ordem dos Advogados.

O estágio decorre durante o período de um ano e meio, sendo acessível a todos os que pretendam inscrever-se, não existindo limitações de acesso.

O estágio é composto por um período inicial de seis meses, em que se reveem, numa perspetiva essencialmente prática, as matérias principais da profissão, destacando aqui três áreas: a Ética e a Deontologia Profissional, que é uma matéria que, em regra, a licenciatura em direito não contempla; a Prática processual Civil, que numa perspetiva prática incide sobre a tramitação de processos e a gestão dos litígios na área do Direito Civil; e, por fim, as Prática Processual Penal. 

Decorridos os 6 meses iniciais, ao advogado estagiário é atribuída a carteira profissional de advogado estagiário que lhe confere competências próprias para a prática de alguns atos no exercício do mandato.

Segue-se depois um período que corresponde à atividade do estagiário a desenvolver no escritório do patrono. Ao advogado estagiário é atribuído um patrono, um advogado com inscrição na Ordem há mais de 5 anos e que tem visa proporcionar ao estagiário o contacto com todos os aspetos da advocacia.

O estagiário deve assistir a consultas jurídicas, aprende a receber o cliente, a conduzir as reuniões e a percecionar como se estabelece a relação entre o advogado e o seu cliente. O contacto estabelecido com o cliente na primeira reunião reveste-se da maior importância, pois pressupõe uma relação de confiança no relacionamento cliente/advogado, de modo a que aquele se sinta bem representado, permitindo ao advogado contar com a total colaboração do cliente na gestão do processo. 

No âmbito da atividade desenvolvida no escritório do patrono, o estagiário aprende a tratar/tramitar os processos através da elaboração de peças processuais, contactar serviços públicos, solicitar certidões, comparecer e intervir em tribunal e, para no final deste período, o estagiário elabora os relatórios de toda a atividade desenvolvida durante esta fase.

Após o decurso deste período de um ano e meio, tem lugar a realização de um exame escrito e exigente, além de uma entrevista. É necessário que o estagiário obtenha aproveitamento nestes exames para que se possa inscrever na Ordem dos Advogados como tal.

Pode contar-nos um pouco do seu percurso académico e profissional e algumas experiências que já teve?

Tendo em conta a vastidão que a área do Direito representa, não é possível que um advogado se dedique, com total empenho e absoluto domínio, a todas as áreas do direito e, por opção ou por circunstâncias da vida, acabamos por nos especializar em certas áreas. O meu conselho é que participem no maior número de cursos de especialização que puderem, quer em pós-graduações, cursos livres, mestrados, etc. Todos são importantes para a evolução e crescimento profissional.

Quanto a mim e como advogada, além dos graus académicos (licenciatura, mestrado, doutoramento), o curso de que sinto ter tirado grande proveito foi o Curso de Mediação de Conflitos. Isto porque, no exercício da advocacia, há uma visão muito litigiosa dos assuntos. 

A mediação traduz-se numa abordagem mais pacífica da resolução de conflitos, com a aprendizagem e o desenvolvimento de técnicas destinadas a resolver situações de tensão ou de conflito que evitam a propositura da ação ou permitem, na pendência da mesma, resolver, por acordo, o diferendo entre as partes. Como diz o ditado: “Mais vale um mau acordo do que uma boa demanda”.

Sabendo que para além da advocacia também exerce funções no TAD (Tribunal Arbitral do Desporto) pode falar-nos um pouco sobre esta experiência?

A experiência no TAD foi muito importante. Na qualidade de árbitro, coloco-me no papel do julgador, tendo que decidir os conflitos que, em certas áreas do desporto, surgem. 

A minha atividade no TAD implicou um conhecimento aprofundado do direito administrativo e de um ramo muito específico do direito, que é o Direito do Desporto. 

Após vinte anos de exercício da advocacia, a intervenção como árbitro colocou-me, face ao processo, numa posição muito diferente daquela a que estava habituada, o que me proporcionou uma visão diferente e mais abrangente dos processos. 

Por outro lado, também é formadora na ordem dos solicitadores e agentes de execução o que nos pode dizer sobre essa área uma vez que é também uma das saídas do curso?

Apesar de não ser solicitadora nem agente de execução, a verdade é que tenho uma ligação muito especial a estes profissionais. 

Comecei muito nova a ministrar formação aos solicitadores estagiários e, a partir daí, estabeleci uma relação de grande proximidade com a OSAE (Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução).

Em 2003 acompanhei de perto a mudança de paradigma no regime da ação executiva, que consagrou no ordenamento jurídico português um novo profissional: o agente de execução. Esta reforma legislativa procedeu à reorganização e repartição de competências entre os intervenientes processuais no processo executivo e cujas competências principais são as exercidas pelo agente de execução. 

O agente de execução é um profissional liberal que, investido de poderes de autoridade, pratica, em representação do Estado e do Tribunal, os atos executivos e coercitivos que a execução pressupõe. É da competência do agente de execução a realização de penhoras, a entrada e desocupação coerciva de imóveis, penhora de contas bancárias, etc.

A solicitadoria também é uma profissão forense, mas com competências diferentes da advocacia. Os solicitadores são licenciados em Solicitadoria ou Direito e, depois de frequentarem o estágio de um ano ministrado pela OSAE, adquirem competências no âmbito do patrocínio judiciário e da consulta jurídica. Quanto ao patrocínio judiciário, o solicitador tem competências mais limitadas do que o advogado, pois não pode exercer o mandato judicial no processo penal e, nas ações cíveis, a sua intervenção também se encontra limitada.

Qual foi o maior desafio que enfrentou no exercício da sua atividade profissional?

A profissão de advogado é um dos principais pilares de sustentação do Estado de Direito Democrático. O advogado é um defensor da ordem jurídica, um guardião da liberdade, da equidade e da justiça. Daí que o exercício da advocacia só seja possível com grande empenho em todos os processos, independentemente da sua natureza. No entanto, há processos que, pela natureza dos direitos em causa, nos tocam mais do que outros, como acontece com os processos na área do Direito da Família e de Menores e do Direito Penal.  

O advogado deve ter consciência da enorme responsabilidade que o exercício da profissão acarreta e, por isso, todos os processos representam um grande desafio.

Quais as suas expectativas para o futuro, com todas estas alterações com a digitalização e a pandemia?

O desenvolvimento da inteligência artificial é a grande revolução tecnológica em andamento na nossa era e está a modificar profundamente o nosso modo de vida em todas as áreas.

A área jurídica também está a sofrer impactos retumbantes em razão da expansão da inteligência artificial, pois determinadas tarefas jurídicas são atualmente realizadas por máquinas e softwares com maior rapidez, eficiência e eficácia, com menor custo.

Afirmar que os advogados serão, no futuro, substituídos por inteligência artificial e robôs é algo que me parece muito distante. Afinal, na advocacia, o fator pessoalidade é determinante e essencial para gerar confiança e credibilidade. 

A pergunta é esta: o cliente delegaria uma causa importante da sua vida num robô ou na inteligência artificial? Talvez não.

A inteligência artificial na advocacia tem a sua utilidade, mas que não pode estar ligada à parte mais humana e pessoal que a relação advogado/cliente pressupõe.

O principal objetivo da inteligência artificial é garantir mais agilidade e eficiência na prestação de serviços jurídicos, permitindo otimizar o trabalho do advogado. No entanto, não o pode substituir, tal como as máquinas, na revolução industrial, não substituíram os trabalhadores.

O que motiva um cliente a contratar um advogado é a sua reputação, a segurança e a credibilidade que ele possa transmitir. Por muita informação que um robô seja programado para analisar, ele não é capaz de suprir as necessidades do relacionamento junto do cliente, que conta com fatores muito mais complexos do que a análise de jurisprudência ou dezenas de documentos.

No entanto, os advogados não devem temer o desenvolvimento da inteligência artificial. Pelo contrário, há que reconhecer estas mudanças e aceitá-las como um aspeto crucial de eficiência, num mercado tão competitivo.

 

Para finalizar, tem algum conselho que gostasse de deixar aos nossos estudantes de Direito que tenham como objetivo ingressar na Ordem dos Advogados?

O mais importante é o gosto pela profissão, devendo ser esta a principal motivação para ingressar na Ordem dos Advogados.

Por outro lado, sendo o Direito, na sua essência, um conceito em constante mutação e perante a diversidade de questões e litígios que hoje enfrentamos, é necessária uma abordagem mais especializada do direito. 

Assim, a formação e a aquisição constante de conhecimentos é um aspeto determinante, que todos os estudantes devem ter em conta.  

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